Resenha: “A Nascente”

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A Nascente (no original, The Fountainhead), publicada em 1943, é uma obra seminal de Ayn Rand, escritora e filósofa conhecida por desenvolver o objetivismo, corrente de pensamento centrada no individualismo e na racionalidade. O romance aborda as tensões entre a fidelidade aos próprios valores morais e as concessões impostas pelas normas sociais, acompanhando a trajetória de Howard Roark, um arquiteto inovador e determinado que enfrenta resistências ao desafiar convenções estéticas e éticas do seu tempo.

O lançamento de A Nascente ocorreu em um período marcado pelo fim da Grande Depressão e pela Segunda Guerra Mundial. Esse específico contexto histórico reforça a centralidade de temas como a resistência contra o coletivismo, pilar da narrativa construída pela autora. Para Rand, as forças sociais que suprimem a individualidade e promovem o conformismo são análogas às estruturas totalitárias que emergiram no século XX, devendo ser rechaçadas por todo homem que deseja ser livre.

Além do contexto global, o contexto político e arquitetônico da cidade de Nova Iorque, nos anos 1930 e 1940, local no qual o romance foi ambientado, era marcado por profundas transformações urbanas e culturais. A modernidade arquitetônica defendia a rejeição de ornamentos e priorizava linhas limpas, materiais industriais e funcionalidade. Nova Iorque estava no centro dessa transição, refletindo as disputas entre o conservadorismo estético e as novas propostas radicais.

Howard Roark, o protagonista de Rand, encarna o arquétipo do arquiteto moderno ao enfrentar o tradicionalismo e defender intransigentemente a autenticidade artística. Ele é retratado como um personagem que se recusa a comprometer sua visão criativa e seus valores morais em troca de aprovação social ou das demandas do mercado. Desde sua decisão de abandonar a faculdade de arquitetura, por não aceitar conformar-se às normas impostas, até a recusa de contratos que exigiriam adesão a estilos tradicionais, Roark exemplifica sua aversão ao conservadorismo estético. Para ele, a arte deve ser uma expressão genuína da individualidade e da inovação, uma convicção que é reafirmada de forma poderosa no discurso emblemático que realiza durante seu julgamento, um momento crucial da narrativa em que defende seus ideais com eloquência e paixão.

Rand utiliza os conflitos arquitetônicos e sociais de Nova Iorque como uma metáfora abrangente: a cidade torna-se um campo de batalha entre a mediocridade dos “homens de segunda mão”, que se acomodam às normas, e a genialidade dos homens de “primeira mão”, que buscam romper barreiras. Nas suas pouco mais de 900 páginas, o leitor encontrará uma trama que põe em xeque as tensões entre coletivismo e individualismo, entre as relações de poder e a fidelidade aos próprios valores, que se entrelaçam na vida de personagens como Peter Keating, Dominique Francon e Ellsworth Toohey.

Sendo um romance, o estilo narrativo de Rand é direto e funcional, priorizando a clareza da mensagem filosófica em detrimento de nuances literárias. O ritmo do romance, especialmente em suas passagens mais discursivas, pode parecer arrastado para leitores que esperam uma narrativa mais ágil e emocionalmente envolvente. No entanto, A Nascente consolidou Ayn Rand como uma figura influente, especialmente nos Estados Unidos, onde seus ideais de objetivismo encontraram ressonância no ethos capitalista.

Desde sua publicação, A Nascente tem sido amplamente debatida tanto por suas qualidades literárias quanto por seu impacto ideológico. Rand resiste a paradigmas tradicionais, apresentando uma visão provocadora do egoísmo racional como virtude, o que é, ao mesmo tempo, inspirador e controverso. A crítica ao altruísmo como uma força inerentemente destrutiva, proposta por Rand, é frequentemente vista como reducionista, ignorando a complexidade das motivações humanas e das interações sociais.

Apesar das críticas, trata-se de uma obra ambiciosa que provoca reflexões profundas sobre a autenticidade e o preço do individualismo. Embora sua abordagem filosófica seja polarizadora e seus personagens frequentemente sirvam mais como arquétipos do que como figuras realistas, o livro permanece uma leitura essencial para quem deseja explorar a relação entre ética, criatividade e poder. A Nascente não é apenas um romance; é um manifesto filosófico, cujas implicações continuam a ecoar em debates contemporâneos.

*Brigida Passamani é associada do Instituto Líderes do Amanhã. 

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