O Brasil voltou, mas para o século errado
— Com licença, esta cadeira está vaga?
— Sim, claro. Estava reservada para um país sério.
— Perfeito. O Brasil senta mesmo assim.
Foi mais ou menos assim que recomeçamos nossa jornada diplomática após a eleição de 2022 – com pompa de salão, promessas de gala e a ilusão de que bastava trocar o ocupante do Planalto para transformar o país num baluarte da civilização.
O grande mote, repetido ad nauseam por colunistas progressistas, artistas de streaming e doutores em sociologia de campus, era claro: o país precisava de luz, diálogo e prestígio.
O que recebemos foi sombra, monólogo e desprestígio disfarçado de causa.
Dois anos depois, aqui estamos. Com um presidente que abraça Putin, parabeniza Ortega, afaga Maduro, sorri para Xi Jinping e relativiza um massacre brutal em Israel com a leveza de quem comenta um empate na Série B. Um presidente que, diante da barbárie do Hamas em 7 de outubro — que incluiu estupros, decapitações e crianças carbonizadas —, soltou a frase: “Hamas também tem trabalhadores”.
Mas não há nada que não possa piorar. Agora, o obsceno apoio do país ao Irã contra Israel. Escárnio.
Porém, isso, diriam os militantes de rede social, é geopolítica. É estratégia. É “resgate do protagonismo internacional”. O Brasil voltou — repetem, sem notar que a fila dos países sérios segue andando, em silêncio e sem nos esperar.
A diplomacia lulopetista se converteu num teatro ideológico desidratado, onde os gestos são para a plateia de hashtags e não para os interesses do país. Enquanto a diplomacia exige nuance, timing, pragmatismo e cálculo — qualidades que fariam Henry Kissinger parecer um alienígena em meio aos nossos diplomatas de TikTok —, o Brasil se especializou em berrar slogans velhos para plateias vazias. Substituiu comércio por catecismo. Substituiu acordos por afagos. Substituiu Estado por panfleto.
A nova diplomacia brasileira não se move por interesses. Move-se por curtidas. O resultado, como sempre, não aparece na manchete, mas no caixa das empresas. O agronegócio brasileiro, que floresceu apesar do PT, hoje apanha por causa dele. A Embraer perde contratos. Exportadores de proteína animal enfrentam restrições. Investidores evaporam. Não porque somos ruins — mas porque somos alinhados ao que há de pior. Os parceiros sérios, mesmo com posturas ideológicas diversas, sabem distinguir ideologia de insanidade.
Diplomacia é o oxigênio do comércio internacional. Sem ela, nenhum país respira negócios. Esse é o ponto que os marxistas de Instagram jamais entenderão.
Para eles, diplomacia é desfile de causas, mas, para quem emprega, investe e exporta, diplomacia é mercado, acesso, estabilidade, confiança. O setor privado — aquele mesmo que paga impostos, gera empregos e sustenta o Estado — é tratado como uma espécie de inimigo invisível do povo, enquanto ditadores são recebidos com tapete vermelho.
O Brasil, outrora aspirante a protagonista global, se transformou num diplomata folclórico: arrogante, irrelevante e, no fundo, cada vez mais sozinho. A conta não é só econômica. É moral. É histórica.
Daqui a dez ou vinte anos, talvez um estudante leia nos livros que, num dos momentos mais críticos do século, o Brasil optou por acenar para os tiranos. Que relativizou terrorismo. Que sorriu para ditaduras. Que abandonou o eixo do progresso para se perder no brejo da nostalgia revolucionária. Que preferiu a ideologia ao interesse nacional.
E fez isso com orgulho — e, absurdamente, com aplausos. Como bem alertava Raymond Aron, com brutal clareza: “A política externa é o lugar onde a ideologia vai para morrer — ou para matar”.
No caso brasileiro, faz as duas coisas: mata acordos, mata oportunidades — e morre de espanto e ridículo. Sim, o Brasil voltou. Voltou para o lado errado, na hora errada, com os aliados errados.
Voltou para os jantares que não servem comida. Para os aplausos que não assinam contrato. Voltou para a História, mas para o pé da página, entre as notas de rodapé que ninguém lê. E voltou com tamanha convicção… Que talvez só perceba onde está quando for, enfim, gentilmente desconvidado do mundo.
O Brasil voltou. Mas ninguém abriu a porta. E não abrirão. Não enquanto durar a epopeia autodestrutiva do lulopetismo diplomático. Porque há países que erram por ingenuidade. Outros, por pragmatismo. Mas o Brasil escolheu errar por vaidade.