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Três motivos para não comemorar o 15 de novembro

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Algumas datas são lembradas, comemoradas e exaltadas por cidadãos mais engajados quase que por osmose, sem pensar muito no real significado e no contexto por trás daquele momento histórico. Ainda mais do Brasil, onde o ensino tem deficiências crônicas e os livros didáticos padecem de ranço ideológico e preconceito jocoso contra certos personagens históricos. Este é o caso do evento da Proclamação da República, em 15 de novembro. De fato, é só um nome bonito para disfarçar o que realmente foi: um golpe militar que destituiu Dom Pedro II e a família imperial brasileira. Como resultado, nos legou uma série de desarranjos, situações que instabilizaram uma jovem nação de apenas 67 anos, até então acostumada com um modelo de governo baseado no pilar sólido de uma monarquia constitucional parlamentarista.

Entenda em três pontos por que não temos nada a comemorar quando o calendário chega novamente a 15 de novembro.

Foi um golpe militar que instalou uma ditadura

Não foi um momento de grande nobreza, preparado sob a égide dos mais elevados sentimentos patrióticos como o pintado no quadro oficial. O novo regime republicano se impôs por meio de um golpe militar liderado por um ex-monarquista convertido há pouco tempo, o marechal Deodoro da Fonseca, e ocorreu antes do momento previsto devido a um alarde de que o chefe das Forças Armadas teria sido preso um dia antes, o que gerou uma agitação e a antecipação do movimento, previsto para ser deflagrado em 20 de novembro. Diferente do que se imagina, o poder foi tomado por uma minoria formada por militares, advogados, cafeicultores, entre outros setores da elite. O povo em si estava alheio à proclamação e foi persuadido ao longo do tempo a introjetar em sua mente os ideais, símbolos e instituições republicanas. Tudo porque não havia tempo de fazer isso antes de assumir as rédeas do país neste que foi o primeiro de uma série de golpes militares que se seguiram ao longo de todo o Século 20. O receituário, tanto na quartelada de 1889 como nos demais, é o mesmo: jornais passaram a ser perseguidos e controlados, e opositores da República, perseguidos. É a tentação na qual invariavelmente governos centralizadores e autoritários caem. Por isso, governos limitados correspondem a mais liberdade para o cidadão, em todos os aspectos de sua vida pública e privada.

Encerrou o período mais livre e estável que o Brasil já teve

O Brasil monárquico pode ser dividido em três grandes fases: o Primeiro Reinado (1822-1831), com Dom Pedro I, o Período Regencial (1831-1840), após a renúncia de Pedro I e até seu herdeiro estar apto ao trono, e o Segundo Reinado (1840-1889), já com Dom Pedro II. Antes mesmo da independência do país, Pedro I, um defensor de ideais liberais, promulgou uma série de decretos que garantiam direitos individuais, a redução de impostos, além de indicarem as suas visões abolicionistas. Mais tarde, quando ele cruzou o Atlântico de volta para Portugal, na Regência, houve uma série de revoltas regionais que ameaçaram a unidade do Império, que, com a estruturação e emprego das Forças Armadas, conseguiu manter a unidade nacional.

Já o Segundo Reinado foi o período de maior estabilidade política do Brasil até hoje. D. Pedro II conseguiu manter o equilíbrio político, o país começou a se modernizar com o desenvolvimento de ferrovias, teve a introdução dos telégrafos e de aparelhos telefônicos. Foi também um momento de florescimento das artes, como literatura, teatro, arquitetura, artes visuais e até mesmo a fotografia. O imperador, ele próprio, era um intelectual de primeira linha, reconhecido e frequentador desse seleto círculo internacional.

Em suma, no Império, a liberdade de imprensa era presente – jornais podiam zombar do governo sem medo de represálias. Parte significativa do imaginário político e símbolo do Brasil como nação datam dessa época. Com sabedoria, moderação e equilíbrio entre princípios e políticas liberais e conservadoras, Dom Pedro II e sua família garantiram avanços institucionais importantes. O maior deles foi pelas mãos da princesa Isabel, que sancionou a Lei Áurea em 13 de maio de 1888 e pôs fim à escravidão no Brasil.

A política liberal deu lugar ao positivismo

Enquanto os vizinhos da América espanhola se fragmentavam em pequenas Repúblicas, comandadas por caudilhos, o Brasil Império era visto como uma ilha de civilização em meio à barbárie. Com o país organizado sob uma monarquia constitucional parlamentarista, o debate se dava com forte presença de ideias liberais. Porém, a maré foi mudando a partir do incremento do positivismo nos círculos militares.

As Forças Armadas ganharam prestígio e popularidade com a vitória na Guerra do Paraguai. Dessa forma, achavam-se no direito de reivindicar mais reconhecimento. Além desse fator, havia a ascensão de uma elite urbana, que não tinha representação política. O modo como a abolição foi conduzida os desagradou, enfraquecendo a corte de Pedro de Alcântara. No campo do pensamento, o positivismo, movimento de grande influência na época, uma corrente filosófica que valoriza a racionalidade e a tecnocracia em detrimento da tradição, também tem sua parcela de culpa no golpe militar, tendo em vista que a monarquia era sinônimo de tradição.

Na República, o positivismo, uma linhagem coletivista e dirigista, prima do socialismo, ganhou espaço e foi difundido até na bandeira do país com o lema “ordem e progresso”. Essa escola da sociologia francesa, fundada por Augusto Comte, tem como alicerce o ideal iluminista de progresso científico, tecnológico e social por meio da ordem. É daí que surge a justificativa para governos autoritários: quando vislumbram um cenário de fragilidade e suposta desagregação nacional, entram em campo para impedir que a “política” e demais assuntos tidos como menores atrapalhem o que seria uma administração “técnica”, “racional” e “eficiente”, sem “paixões ideológicas”. É quando se suprime a discussão política e o livre debate de ideias: a forma dirigista acaba centralizando o poder, regendo a economia com mão pesada, sufocando a livre iniciativa.

Esse modo de condução não havia no Brasil monárquico. A ideia de um imperador é justamente para que ele não se insira em assuntos da política do dia a dia, em questões “terrenas”, e se ocupe de temas de Estado, da representação máxima do país, e seja chamado como um poder moderador constituído e desinteressado em interesses privados, eleitorais e sucessórios para arbitrar impasses políticos com os mais elevados níveis de tradição, cultura, senso de dever e equilíbrio.

*Douglas Sandri é graduado em engenharia elétrica, presidente do Instituto de Formação de Líderes de Brasília e chefe de gabinete na Câmara dos Deputados.

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