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O Caminho da Servidão e o alerta de Friedrich von Hayek sobre o Estado

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O Caminho da Servidão é a obra mais famosa de Friedrich von Hayek, economista e filósofo político, reconhecido por muitos como o maior defensor da liberdade política, econômica e individual do século XX. A obra representa um alerta para o avanço do gigantismo estatal sobre as liberdades civis e econômicas, em meio a uma comunidade internacional abalada pela Segunda Guerra Mundial e de uma sociedade empolgada com o New Deal.

Quem foi Friedrich Hayek?

Nascido na cidade de Viena em 1899, foi um descendente da nobreza austríaca e pretendia se tornar psiquiatra. Contudo, com os eventos da I Guerra Mundial, período de propagação dos ideais socialistas com a Revolução Russa em 1917, mudou de planos e decidiu ingressar na Universidade de Viena.

Aos 23 anos, já era doutor em Direito e Economia Política e passou a frequentar o seminário do professor Ludwig von Mises, que era considerado como o centro do debate econômico da capital da Áustria. A despeito de Hayek ser considerado um economista proeminente, as aulas passaram a exercer profunda influência em seu trabalho, mas ele não apenas aceitou as ideias de Mises.

Por já ser diplomado, buscou pressioná-lo de modo mais crítico. “Concordava completamente com as conclusões de Mises, mas nem sempre com os argumentos para se chegar até lá”, como ele próprio afirmou em entrevistas ao longo da vida. Por conseguinte, esse panorama representou um estímulo intelectual para Hayek, que passou a trabalhar no aperfeiçoamento dos argumentos de seu mentor.

Na sequência, ele lecionou na Universidade de Viena e em sua primeira metade de vida, destacou-se ao envolver-se academicamente nos grandes debates econômicos da época desde a publicação de seu primeiro livro. Em Monetary Theory And The Trade Cycle, entrou em conflito com as duas principais correntes de pensamento da época: o socialismo e o Keynesianismo.

O argumento da obra baseia-se em que a intervenção governamental na economia pode causar falhas ou distorções que podem levar eventualmente à ruína econômica ao prejudicar a transmissão de informações pelos preços. Por conseguinte, preços são mecanismos que transmitem conhecimento, sendo que intervenções governamentais na economia poderiam gerar distorções na transmissão dessa informação.

O cálculo econômico do socialismo

O austríaco passou anos envolvido no debate do cálculo econômico do socialismo, incrementando o argumento inicial de Mises, segundo o qual o socialismo era tecnicamente impossível. Afinal, sem o ajuste de preços baseado na propriedade privada, não haveria sinais para os planejadores socialistas calcularem o valor relativo de bens e serviços. Além disso, tampouco existiriam informações para decidirem quais métodos de produção eram mais eficientes. O conhecimento econômico, para Hayek, estava disperso entre todos os indivíduos, o que tornava o planejamento central, desejado pelos socialistas, impossível de ser realizado com a mesma eficiência da iniciativa privada. Contudo, alertou que, uma vez posto em prática, os resultados seriam catastróficos.

No início da década de 1930, as atenções de Friedrich Hayek se voltam para explicar a Grande Depressão Americana. Argumentou que a origem da crise se devia a interferências do estado no mercado e que as medidas defendidas pelo economista inglês John Maynard Keynes, que considerava papel do governo estimular o crescimento a partir de aumento do gasto público, geram inflação.

Sustentava ainda que a origem de toda a crise provocada pela Grande Depressão teria se dado a partir de intervenções anteriores do governo americano, que estimulou investimentos ruins do mercado, concluindo que os preços deveriam flutuar sem interferência. Contudo, o debate foi interrompido publicamente após a publicação da Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, que representou um ataque à economia liberal clássica: Hayek considerou que as ideias de maior controle governamental sobre a vida econômica de Keynes não seriam abraçadas pela opinião pública — o que se mostrou um grande erro.

O Caminho da Servidão, de Hayek

Os anos seguintes foram difíceis e, em meio a um entusiasmo crescente pela intervenção do governo e pelo planejamento central no contexto da Segunda Guerra Mundial, Hayek mudou seu foco de interesse para a filosofia política. Ele notou que o debate entre a economia planejada e o livre mercado não era uma questão meramente econômica, mas um ponto fundamental de liberdade política, porque planejar a economia significava, na prática, controlar a vida das pessoas.

Dessa forma, permitir que autoridades governamentais interferissem na vida econômica fixaria as bases para a ascensão do totalitarismo. Portanto, defender um papel ativo do estado na economia era “ajudar a chocar o ovo da serpente”.

Esse argumento é desenvolvido em O Caminho da Servidão, em que atacou o nacional-socialismo por cometer os mesmos erros que o socialismo-marxista — um pensamento visionário para a época. Assim, o livro foi um aviso de que o resultado da experiência coletivista seria a negação da liberdade e a desumanização dos que não se encaixavam na sociedade idealizada pelos burocratas.

O professor Hayek explora o argumento de que o totalitarismo não resulta da queda repentina de um regime democrático por um partido ou facção autoritária, mas sim é uma consequência não intencional de sucessivas intervenções governamentais cujos proponentes não desejam o resultado totalitário que suas ações produzem.

O argumento da ladeira escorregadia de Hayek

O argumento foi denominado de Slippery Slope (ladeira escorregadia), em que Hayek, em um momento compreensivelmente pessimista da história global, afirma que a intervenção econômica levaria inexoravelmente ao totalitarismo se prolongada por muito tempo e que um sistema de economia mista é inerentemente instável.

Contudo, após quase sete décadas da publicação de O Caminho da Servidão, evidências históricas e empíricas felizmente contrastam a hipótese de Hayek. Como apontado por pesquisadores da Universidade Católica Portuguesa e da King’s College London em Hayek’s Slippery Slope, the Stability of the Mixed Economy and the Dynamics of Rent Seeking, desde a década de 1970 houve estabilização no tamanho do gasto público médio da economia global.

Isto é, não há determinismo histórico e, segundo critérios expostos pelo Ranking de Liberdade Econômica da Heritage Foundation e do Freedom House da The Economist, nunca houve tanta liberdade econômica e de liberdades civis e individuais na história.

Não à toa, em 1989, Francis Fukuyama teorizou em The End of History? que as democracias liberais tinham vencido, tornando consensuais ideias como direitos de propriedade, livre expressão, livre mercado de preços, democracia representativa e limitação do estado a partir da Constituição.

O legado de O Caminho da Servidão

É importante salientar, contudo, que as falhas fundamentais no argumento da ladeira escorregadia de Hayek não reduzem a importância de suas contribuições gerais para a economia política. O maior filósofo político do século XX continua muito atual porque não precisamos ter estados totalitários para registrarmos altos níveis de intervenção governamental que, em última análise, podem nos impedir de termos os ganhos civilizacionais que tanto almejamos.

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Luan Sperandio

Luan Sperandio

Analista político, colunista de Folha Business. Foi eleito Top Global Leader do Students for Liberty em 2017 e é associado do Instituto Líderes do Amanhã. É ainda Diretor de Operações da Rede Liberdade, Conselheiro da Ranking dos Políticos e Conselheiro Consultivo do Instituto Liberal.

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