fbpx

Série “Espiritualidade e Pensamento Liberal” – Racquell Narducci (Paganismo e Magia / Dianismo)

Print Friendly, PDF & Email

dianismo(Esta entrevista faz parte da série “Espiritualidade e Pensamento Liberal”. Para entender a proposta da série, leia o texto de apresentação no seguinte link: Série Espiritualidade e Pensamento Liberal – Apresentação)

Racquell Narducci é contabilista e se autodefine ideologicamente como libertária. Na entrevista de hoje para nossa série que discute a interface entre pensamento político e pensamento religioso ou espiritual, nas mais diversas vertentes – das consideradas mais tradicionais até as consideradas menos conhecidas ou exóticas -, ela relaciona suas crenças pagãs e magísticas à sua adesão ao libertarianismo.

racquell narducci

Seguindo o costume na série, gostaria que fizesse primeiro uma síntese de sua própria fé. Como a define?

Penso ser muito complicado me definir precisamente. Talvez eu deva dizer que sou adepta do Dianismo (culto à deusa Diana) desde que nasci, pois fui criada pela minha avó italiana e com essa religiosidade familiar. Porém, cresci e me identifiquei com outros caminhos também. Primeiro me iniciei no Xamanismo, depois me desenvolvi na Umbanda, também enveredei pelo Candomblé e fui da Irmandade das Geledes (culto às Iyami, um grupo religioso com origem na sacralização feminina iorubá). Estudo sobre tudo isso com muito afinco, pois tenho um amor muito grande pela magia e pelo Ocultismo. Porém, minhas práticas atuais são mais voltadas à nova magia do caos, ou Caoísmo.

Você se define, em termos de convicções políticas, como uma libertária, não é isso? Embora sua espiritualidade pagã seja moldada em diferentes tradições e fontes, a partir do que você conhece a respeito dos praticantes dessas religiões, existe alguma tendência política em seu meio? Há o costume de serem mais liberais, ou mais tendentes ao socialismo?

Tenho convicções políticas libertárias, porém não percebo entre pagãos e/ou seguidores de religiões afro-brasileiras essa tendência geral. Ao contrário; pagãos costumam querer a interferência dos governos em favor da natureza em geral e afro-brasileiros em favor de movimentos negros e de proteção religiosa. Assim sendo, sempre, de alguma forma, buscam mais governo; eu, em oposição, desejo buscar sempre menos governo, por pensar que quanto menos o governo governar, maior é a nossa liberdade real.

Apesar dessa tendência que você verifica no país entre os adeptos dessas correntes religiosas, existe alguma influência das suas crenças espirituais e metafísicas pessoais sobre as suas ideias políticas e econômicas, ou, para você, são coisas inteiramente separadas? Se há, em que medida e de que natureza? Como você enxerga essa interface?

Penso que minha espiritualidade e religiosidade têm muito a ver com minha tendência política. A busca que fiz e ainda faço a nível espiritual é uma busca livre, sem restrições ou dogmas impostos por terceiros e, num paralelo, o mesmo ocorre com as minhas ideias políticas libertárias. Há algo de anarquismo em tudo isso, mas não aquele anarquismo anticapitalista, pois o dinheiro foi uma importante criação para servir melhor às trocas de mercadorias e serviços, mas um anarquismo no sentido de colocar abaixo todas as regras, leis, dogmas religiosos e políticos, enfim, promover questionamentos em ambas as esferas (política e religiosa). A meu ver, quem não questiona nada, nada aprende, e quem não contribui para uma mudança para melhor é um mero seguidor de ditames dos outros e sequer sabe para onde irá.

No seu desenvolvimento histórico, nos textos de autores pagãos ou nas obras de teóricos que inspirem a sua crença, se as há, existe algo de explicitamente político ou que tangencie temáticas políticas?

Se partirmos do princípio de que qualquer relacionamento humano já está no âmbito da política, penso que sim. No entanto, se formos restringir a política a conceitos partidários e ideológicos, não houve em nenhuma literatura de referência algo que seja explícito nesse sentido. Penso que a magia do caos, ou Caoísmo, e principalmente os autores da teoria hermetista, como Crowley (Aleister Crowley, famoso ocultista britânico), e até os brasileiros Raul Seixas e Paulo Coelho, que o seguiam, têm uma abordagem que deixa um tanto claro um certo anarquismo em seus modos de pensar na sociedade que possivelmente me inspirou.

Queria que você pontuasse se há alguma base, a partir do pensamento pagão, para pensar sobre as estruturas e princípios de uma sociedade moderna vigente sob a ordem liberal, quais sejam: o Estado de Direito, a liberdade de expressão, a liberdade econômica, a propriedade privada, a descentralização de poder, a responsabilidade individual e a igualdade de todos perante a lei.

Os neopagãos eventualmente têm pensamentos um tanto tribais e fantasiam que a vida era melhor quando apenas se plantava e colhia para comer. Obviamente existem pagãos que sabem que isso é um delírio fantasioso, afinal a tecnologia nos trouxe problemas ambientais, mas também um mundo que nunca antes foi tão próspero e tão interligado culturalmente. Em geral, esses pagãos tendem a migrar para formas de magia ou Ocultismo consideradas mais “elitistas” (como eles mesmos costumam dizer), como a magia cerimonial, Teosofia e Hermetismo. Não se deixa de louvar a Mãe Terra, a Lua ou o Sol, apenas não o fazem mais como camponeses. Até para as religiões de cunho africanista está complicado insistir em certas noções arcaicas, pois não existem mais estradas de chão próximas às cidades para fazer as magias que antigamente eram feitas. Tudo se transforma e precisamos dessa evolução. Dentro da sociedade moderna, no que concerne a essas religiões, de maneira geral o que mais os desperta socialmente são bandeiras como liberdade de expressão e livre culto ou igualdade de gêneros. Fora isso, não percebo grandes manifestações dos adeptos.

Se desejar, deixe uma mensagem final.

Gostaria de dizer apenas aos adeptos das religiões nas quais me iniciei um dia que desejaria muito que cada um deles pensasse bastante, pois se lhes desagrada tanto a ideia de não ter liberdade de culto, deveriam pensar que governo algum poderá protegê-los apenas por inchar suas atribuições, como não costuma proteger de assaltos e de uma série de outras coisas. É importante nos livrarmos da escravidão, seja ao governo que for, pois somos como escravos e precisamos de uma carta de alforria que a Princesa Isabel (até por ter sido governante) não pode realmente nos dar, nem aos africanos e nem a ninguém, pois apenas a obteremos se reduzirmos os poderes dos governantes sobre nós.

 

Confira as entrevistas anteriores da série:

Rodrigo Constantino (Ateísmo/Agnosticismo)

Victor Grinbaum (Judaísmo)

Davi Caldas (Igreja Adventista do Sétimo Dia)

Eduardo Nascimento (Umbanda)

Carmen Migueles (Associação de Dirigentes Cristãos de Empresas / Catolicismo Romano)

Catarina Rochamonte (Espiritualidade cristã / Filosofia de Bergson)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Faça uma doação para o Instituto Liberal. Realize um PIX com o valor que desejar. Você poderá copiar a chave PIX ou escanear o QR Code abaixo:

Copie a chave PIX do IL:

28.014.876/0001-06

Escaneie o QR Code abaixo:

Lucas Berlanza

Lucas Berlanza

Jornalista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), colunista e presidente do Instituto Liberal, membro refundador da Sociedade Tocqueville, sócio honorário do Instituto Libercracia, fundador e ex-editor do site Boletim da Liberdade e autor, co-autor e/ou organizador de 10 livros.

Pular para o conteúdo