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Parte II – Hegelianismo, marxismo, socialismo e os desastres da Venezuela e do Brasil

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111Um momento antes da atual conjuntura, um período afamado como moderno precipitou-se em teorias absurdas e definitivamente além dos horizontes próprios da averiguação humana. Além de a mensagem sobrepujar o próprio horizonte limitado do conhecimento, seu teor alcançou um patamar só permitido ao discurso advindo da própria revelação. Referimo-nos ao espetáculo metafísico do séc. XVIII onde os maiores progressos técnicos se encaminhavam para uma melhor aplicação e a singular presunção humana lançou o próprio pensamento técnico aos céus, como se a possibilidade de arranjar conceitos fosse suficiente para fazer a verdade fluir.

Recalcitrantes no que tange às demandas críticas impostas por Kant, os idealistas se propuseram uma metafísica romântica incomparável em beleza e em falta de lucidez, pois a própria perscrutação do infinito pressupõe asas outras que as meramente intelectuais. Concentrando esforços na fulguração divina do inusitado intento, o filósofo Hegel se prestou a artes infinitas de dialética enquanto o espírito absoluto de que falava outra coisa não era que a empáfia própria de uma mente obscurecida pela própria potência.

Ligar Deus ao conceito sem atinar para a concordância efetiva entre Deus e fé, sem atinar para a transcendência absoluta de Deus em relação à lógica é sinalizar conflitos e abastecer corretas inclinações sem corretas possibilidades. Não negamos que Deus seja o infinito e o absoluto, negamos que ele seja o infinitamente lógico, pois o logos é tão somente a esfera menor na qual a  inteligência humana pode trabalhar. Limitar Deus à lógica é limitar o homem ao pensamento intelectual e sem vida: coerência desprovida de seiva e de chão, de sapiência existencial e de carnalidade, pois a carne também participa da ascensão gradual ao conhecimento através de suas depurações sucessivas. Como o próprio filósofo se abismava na própria terra inventada, a tendência máxima da estupefação alienante se verifica ao comparar-se a si mesmo ao espírito absoluto sob o pretexto de tê-lo atingido. Tudo isso não passa de desatinos próprios de uma mente privilegiada em um determinado aspecto e obtusamente frágil em outros.

Comparar o esforço hegeliano ao esforço marxista é o propósito do nosso texto, pois enquanto um sobrevoava o tempo em busca do espírito absoluto, o outro solapava as esperanças dos que criam no efetivo espírito. Desterrados do conceito obnubilador de absoluto metafísico, os homens se ataviaram na busca da perfeição terrena por caminhos altamente deturpados e carentes da mais singela e humilde vocação evangélica. Correram atrás das massas e enobreceram cidadãos desprovidos de espírito religioso, respaldaram teses abjetas e demoliram pretensões sãs e coerentes de consolidar paulatinamente uma sociedade hábil e concretamente constituída sob o respaldo da democracia; consolidaram um poderio beligerante próprio da terra e com ele apregoaram o paraíso terrestre, deserdaram homens e assaltaram mãos famintas a propósito de um bem coletivo altamente questionável.

Essa rápida digressão quer fazer ver que um erro teórico, se deixado à solta, conduz a pérfidas consequências e consagra louros à ignorância. O quesito em pauta, porém, não é nem metafísica, nem política, mas a real necessidade humana de conduzir o mundo segundo preceitos radicados em princípios reais.

É verdadeiramente estúpida a crença de que o solapamento das instituições democráticas favorecerá, de algum modo, o povo mais necessitado, aqueles que mais sofrem as desigualdades de um mundo onde reina a obstinada carência de solidariedade e no qual se destina uma ínfima parte dos recursos para uma maioria faminta, enquanto bilionários se comprazem no luxo e na ostentação. Saber que um mundo desigual permanecerá é menos aterrorizante do que saber que um mundo igualmente injusto será alcançado caso se institua outra forma de governo, pois a cupidez humana é tal que não adianta tentar desfigurar um nome qualquer para escondê-la. Não se trata, pois, de um mundo injusto devido a um sistema de produção, mas trata-se de um mundo injusto devido à própria estrutura moral da sociedade.

Não adianta, portanto, tentar alcançar um novo patamar de justiça social delegando poder a alguém que se autointitula o único capaz de partilhar bem o pão para todos, pois esse mesmo alguém que supostamente protegerá o povo será o encarregado de desviar tudo o que estiver ao seu alcance para satisfazer a própria ganância. O perigo do discurso que se projeta como bom é que a própria consciência relaxa, possibilitando àqueles que roubam e que agem de modo imoral perdoarem a si mesmos por se sentirem acima daquilo que lhes ditaria a lei. Uma coisa, portanto, que precisa ficar bem clara em todo debate político é a necessidade com que a mera concessão de um poder arbitrário consegue violar as mais evidentes conquistas favoráveis ao desenvolvimento e ao progresso.

Consentâneo obstáculo ao progresso verifica-se hoje quando os líderes remotos se fazem aplaudir através de uma covarde desistência e de uma anárquica coesão. Venezuelanos se põem em busca de um líder capaz de governar um povo sem que a astúcia e o desatino mental os ponha a perder. Liderados por homens desastrados e deficientes, o povo da Venezuela clama e se revolta sem que a política mundial se dê ao caso de verificar a atual correção do mandato em vigor. O dirigente deste país está completamente louco e, conquanto a democracia seja o esteio fundamental da nossa civilização, o Brasil se prestaria um favor se opondo a um tutor beligerante e deturpado nos mais singulares princípios éticos.

O norte maior da condução comum é a Justiça e a Justiça é o elemento básico de coesão e coerção. Conquanto os esforços diplomáticos de interferir minimamente na soberania nacional seja um zelo elementar, o atual presidente da Venezuela deveria ser banido do cargo a menor violação dos Direitos Humanos. Conduzido pela massa ignorante e pelos partidários débeis, seu mandato consolida-se tão somente pelo apoio popular que, uma vez retirado, deveria retirá-lo do cargo também. O apoio insólito dos países vizinhos se afigura algo abjeto, pois o elemento maior desse apoio é a questão financeira do respaldo energético. Cumplicidade ante a maior falta de respeito aos Direitos Humanos e sórdida aliança por fins materiais é o que se verifica no descaso global com a problemática atual desse país. Convocar o povo ao apoio estudantil e convocar à parcimônia aqueles que se dizem comunistas é uma luta atual e necessária, pois tudo o que diz respeito à honradez e à dignidade humana é objeto de estudo e de direção em qualquer tempo em que se lhes corrompa o progresso.

Uma tentativa de governo construída sob alicerces válidos precisa, necessariamente, estabelecer um foco em algo que supere a proposta inicial de tomada de poder. Tomar o poder para, depois disso, construir algo em benefício do povo parece a mais sólida posição sempre que o povo desconhece a hipocrisia daqueles que o apadrinham. O povo merece sim um cuidado da parte daqueles que o governam e pode exigir proteção das leis que regem a vida pública e civil; não pode, entretanto, requerer daqueles que o governam uma postura pacífica e possivelmente amestradora frente à corrupção do patrimônio que deveria servir para subsidiar aquilo que ele está requerendo. Pode o corruptor corromper pelo bem comum? Não. Por uma questão já estabelecida entre todos aqueles que se situam dentro do limite da Constituição e pela constituição moral da própria consciência que recusa a submissão de uma coisa a uma outra que a destrói.

Para o bem público é necessária a postura digna frente à coisa pública e a promoção de valores condignos à moral e à virtude. Não adianta promover valores em estado de tensão social satisfazendo-se com a retórica hipócrita daqueles que se julgam acima da lei pela possibilidade de converterem em séquitos uma vasta parte de pessoas que lutam pela dignificação. Dignidade concedida não apenas pelo pão, necessário sim, mas pela possibilidade de lutar para conquistá-lo e de conquistar a própria liberdade de pensar para que a proposta seja não de alienação, mas de libertação política. No entanto, tem-se conseguido apenas dominar, coagir, restringir e cercear o pensamento daqueles que supostamente foram “salvos” por um paternalismo abastecido pelas moedas de ouro dos cofres públicos.

Não por acaso se vivencia hoje, no Brasil, uma coisa desastrosa no sentido mais abrangente do termo: desastre no sentido moral, porque, sem parcimônia, ou talvez sem reflexão, pessoas de bem corroboram atitudes absolutamente contrárias aos preceitos éticos por acreditarem que o partido que atualmente governa tem efetivamente estado em favor daqueles que mais carecem de auxílio; desastre político porque se desvinculou totalmente a ética da política como se não houvesse necessidade de justificação quando da deturpação de valores morais; e desastre econômico porque a poderosa potência que poderíamos ter nos tornado acabou se transformando em uma máquina que absorve dinheiro para gente desonesta.

Diante desse quadro restam duas opções: a primeira é retomar a discussão a partir do ponto em que se tratava da lei como máximo ideal, como réplica possível da Justiça e tentar, sob todas as formas, fazer com que aqueles que se desviaram da lei sejam punidos. A segunda opção é permanecermos servis a uma ideologia perniciosa que optou por desqualificar a tarefa de todo aquele que trabalha honestamente por acreditar que a corrupção é justificável quando a sobra dela vai favorecer alguns milhares de indigentes que são alimentados em seus estômagos e cerceados em suas aspirações por um progresso digno e efetivo, que só se pode realizar em um país onde a economia floresce e os políticos não se comprazem em se lambuzar de dólares saqueando o dinheiro que deveria ajudar a levantar o país e levá-lo para o rumo sério do progresso.

 

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Catarina Rochamonte

Catarina Rochamonte

Catarina Rochamonte é Doutora em Filosofia, vice-presidente do Instituto Liberal do Nordeste e autora do livro "Um olhar liberal conservador sobre os dias atuais".

Um comentário em “Parte II – Hegelianismo, marxismo, socialismo e os desastres da Venezuela e do Brasil

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    23/01/2015 em 5:28 pm
    Permalink

    Confesso que foi um prazer ler este artigo, um deleite ante colocações brilhantes.
    Gostei disso:

    “O quesito em pauta, porém, não é nem metafísica, nem política, mas a real necessidade humana de conduzir o mundo segundo preceitos radicados em princípios reais.”

    Se principios reais forem invioláveis justamente por serem reais, será ótimo.
    Existem decisões duríssimas de se tomar, onde a emoção e a razão se põem em vertices opostos. Contudo, se os princípios são reconhecidamente corretos, “bypassa-los” é o caminho para a confusão, para abolir qualquer principio em qualquer situação onde se possa alegar apelos sentimentais.

    Eu prefiro, em certas questões, discorrer sem defender o contexto da pratica diretamente. tentando justamente afastar as emoções que produzem vontades arbitrárias.

    Uma prazerosa leitura, independentemente da plena anuência, apesar de exigente, e nem mesmo posso garantir que atingi a completa compreensão, mas pontos foram tocados com brilhante perspicácia.

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